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Unidade 3:
Perspectiva interseccional sobre a violência doméstica e familiar contra mulheres
Olá, colegas!
Nesta unidade abordaremos a temática da violência contra mulheres a partir da abordagem teórica e metodológica da interseccionalidade. Vamos falar um pouco sobre a origem dos estudos interseccionais, considerando as categorias de raça e gênero, e como pode ser um instrumento importante para contextualizar a violência doméstica e familiar contra mulheres e orientar políticas públicas.
Como tudo começou…
Desde o século XIX, quando começaram os movimentos pelo direito de mulheres, algumas mulheres não se sentiram contempladas pelas reivindicações, pois vivenciavam experiências diferentes. É o caso das mulheres de cor (negras, chicanas, indígenas e latino-americanas, por exemplo). Vejamos um exemplo: quando imaginamos os trabalhos realizados pelas mulheres, desde as sociedades antigas, é comum que a vinculemos com os afazeres maternais e domésticos. Isso significa dizer que as mulheres sempre trabalharam, nem sempre em atividades escolhidas por elas, mas impostas pela organização das sociedades.
No século XX, quando as mulheres brancas começaram a reivindicar o direito de trabalhar fora, expunham sua situação como se fosse a realidade de todas as mulheres. Por outro lado, as mulheres negras trabalhavam fora, na casa das mulheres brancas, desde a escravidão. “A mulher escrava era antes de tudo uma trabalhadora em tempo integral para seu proprietário e, apenas ocasionalmente esposa, mãe e dona de casa” (STAMPP apud DAVIS, 2016, p. 17). A presença de mulheres negras entre maioria das trabalhadoras domésticas persistem até hoje.
Esse exemplo nos permite perceber que a realidade de mulheres brancas de classe média é diferente da realidade de mulheres negras de classe baixa, concordam?!
No decorrer dos anos de 1990, os estudos sobre violência contra mulheres evidenciaram os reflexos do racismo e das desigualdades econômicas, geradores de fragilidades, que forjam um repertório mais reduzido para o enfrentamento das adversidades, inclusive da violência doméstica e familiar.
A incorporação da perspectiva interseccional, no campo da análise das políticas públicas de enfrentamento a violências contra mulheres, surgiu do movimento feminista negro. O termo “interseccionalidade” foi cunhado pela advogada afro-estadunidense Kimberlé Crenshaw e, após a Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Formas Conexas de Intolerância, em Durban, na África do Sul, em 2001, conquistou popularidade acadêmica.
Compreendendo a violência contra as mulheres a partir da perspectiva interseccional.
Apesar da raiz da violência doméstica e familiar estar na discriminação de gênero, as diversas categorias sociais (gênero, classe social, cor, idade, orientação sexual, religiosidade, condição de saúde etc) estão entrecruzadas produzindo diferenças sociais que correspondem também a formas específicas de opressão e desigualdade. A partir dessa perspectiva, apresentaremos alguns dados relativos a violência contra mulheres no Brasil.
a) Gênero ∩ Raça:
Segundo o Mapa da Violência de 2015, as mulheres negras são 66,7% das vítimas de feminicídios no Brasil e 60,5% das vítimas de violência doméstica em geral. De 2003 a 2013, enquanto as taxas de feminicídios de mulheres brancas caíram 9,8%, as de mulheres negras se elevaram em 54,2%.
b) Gênero ∩ Classe:
O risco de envolvimento em feminicídio está associado à desigualdade social. O estudo de Ana Paula Portella (2019) apontou evidências da concentração da violência letal em territórios precários, econômica e socialmente.
Em um estudo realizado no Distrito Federal, foi verificado que em 23,5% dos casos (n=8), a vítima era dependente financeiramente do agressor. Nos demais casos, a diferença de renda levanta a hipótese de que a perda da contribuição financeira do agressor comprometeria significativamente a renda familiar da vítima (ÁVILA, 2020).
c) Gênero ∩ Classe ∩ Escolaridade:
Formação educacional e melhoria nas condições de renda são importantes fatores de imunização para mulheres e homens; usualmente mulheres com maior acesso à informação teriam maior autonomia e menor tolerância às agressões.
d) Gênero ∩ Deficiência:
De acordo com dados da ONG Essas Mulheres, as mulheres são as maiores vítimas de violência física (68%) e sexual (82%) sofridas por pessoas com deficiência. Sabe-se que as mulheres com deficiência sofrem três vezes mais violências do que as mulheres sem deficiência.
Assista agora à video-aula de Kamila Santos sobre o assunto:
Referências Bibliográficas:
WAISELFISZ, Júlio Jacob. Mapa da Violência 2015: homicídios de mulheres no Brasil. Brasília: Flacso, 2015.
PORTELLA, Ana Paula. Para além da violência doméstica: o reconhecimento das situações de feminicídio como imperativo para a eficácia das políticas de prevenção. In: PASINATO, Wania et al. (Orgs.). Políticas públicas de prevenção à violência contra a mulher. São Paulo: Marcial Pons, 2019. p. 109-131.
ÁVILA, Thiago Pierobom de; MEDEIROS, Marcela Novais; CHAGAS, Cátia Betânia; VIEIRA, Elaine Novaes; MAGALHÃES, Thais Quezado Soares; PASSETO, Andrea Simoni de Zappa. Políticas públicas de prevenção ao feminicídio e interseccionalidades. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 2 p.383-415, 2020.

A participação das mulheres negras nos estratos inferiores de distribuição de renda gera a intersecção de mais um fator de desigualdade, relacionado à situação de pobreza. Mulheres pobres possuem mais dificuldades de denunciar a violência, pois a presença de um homem em casa, ainda que abusivo, é muitas vezes uma proteção contra outras formas de violência comunitária, como o crime organizado (ÁVILA et all, 2020, p. 11).
A participação das mulheres negras nos estratos inferiores de distribuição de renda gera a intersecção de mais um fator de desigualdade, relacionado à situação de pobreza. Mulheres pobres possuem mais dificuldades de denunciar a violência, pois a presença de um homem em casa, ainda que abusivo, é muitas vezes uma proteção contra outras formas de violência comunitária, como o crime organizado (ÁVILA et all, 2020, p. 11).
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